LEITURAS

quinta-feira, 3 de maio de 2012

CHUMBADA REELEIÇÃO DE PROCURADOR POLÉMICO


Chumbada reeleição de procurador polémico

Nove membros do Conselho Superior vetam continuidade do procurador-distrital do Porto vDecisão gera mal-estar em magistrados

Publicado às 00.30

NUNO MIGUEL MAIA
(Jornal de Notícias)
foto RUI OLIVEIRA/GLOBAL IMAGENS
Chumbada reeleição de procurador polémico
Alberto Nogueira Pinto não foi reconduzido no cargo
Pela primeira vez na história do Ministério Público, o conselho superior vetou a continuidade de um procurador-distrital no cargo. A "vítima" é Alberto Pinto Nogueira, o procurador mais polémico do MP.
Responsável máximo desde 2006 pelo MP em 72 comarcas do Norte, Pinto Nogueira teve seis votos a favor da renovação da comissão de serviço e nove contra. Em votação secreta. A proposta de eleição tinha sido apresentada, como único nome, pelo próprio procurador-geral da República, Fernando Pinto Monteiro.

PORQUÊ?



Entrevista 
Alberto Pinto Nogueira

Artur Machado

Tânia Laranjo

[JN] Cândida Almeida disse que a PJ podia ser politizada, porque tem de responder
perante o Poder político. Partilha da mesma opinião?
[Alberto Pinto Nogueira] Sempre a PJ dependeu do Poder político e soube cumprir as
suas funções. Alguns "percalços" de momento não significam, a meu ver, que a PJ 
tenha, forçosamente, de "obedecer" aos políticos. Tem autonomia, mas penso que, com
este director nacional, há realmente um perigo acentuado de politização da PJ. Aí,
Cândida Almeida parece-me que tem toda a razão.
Hoje, o Parlamento discute a necessidade de ouvir Adelino Salvado por causa das
demissões na PJ/Porto. Acha que se deve avançar para uma comissão parlamentar de
inquérito?
O Parlamento é o lugar ideal para se esclarecer a matéria que, quanto a mim, e
segundo a Comunicação Social, assumiu foros inauditos. O que sucedeu, e é de
conhecimento público, foi que, de uma assentada, se mudou tudo. Em democracia
estamos todos em regime de prova e o director nacional da PJ também. Não faz o que
lhe apetece, ninguém, num país democrático, faz o que lhe apetece. Há regras, a 

começar pela transparência democrática e isso não sucedeu, quanto a mim, no caso de
que fala. Agora, cabe aos deputados decidir. Mas penso que seria bem oportuna tal
comissão.
Como vê as relações funcionais entre a PJ e o MP?
Do que eu tenho conhecimento - e sei do que falo -, não há nenhuma questão entre o
MP e a PJ, quando se trata de investigação no terreno. Os "desentendimentos"
publicitados enquandram-se mais a níveis superiores de uma e outra das instituições.
Suponho que, enquanto o MP e a PJ não interiorizarem as funções diferentes que
exercem, mas que são complementares, não prestarão o serviço que devem à
comunidade. O MP dirige o inquérito e exerce a acção penal, a PJ investiga. São ambos
imprescindíveis.
Disse, no JN, que as últimas demissões na PJ provocaram um bailado de juízes. Os
magistrados deviam sair das polícias?
Não coloco em dúvida, como não posso colocar, a legalidade dos juízes estarem nas
polícias. Coloco é a questão de saber se é correcto que quem, como diz a Constituição,
nos deve julgar, deve estar nas polícias. Há muitos anos que o professor Vital Moreira
vem dizendo que o lugar dos juízes é nos tribunais, fazendo Justiça. É isso que penso.
Estas ideias aplicam-se, "mutatis mutandis" ao MP, admitindo que este possa, de algum
modo com mais correcção, estar a dirigir a PJ, pois se trata de investigação criminal
ligada, como é óbvio, ao inquérito criminal que o MP dirige. A meu ver, a PJ deveria ser
dirigida pela PGR, assim se acabando, definitivamente, com atritos e prejuízos para a
comunidade advindos de inaceitáveis desvavenças de "capelinhas".
Como recebeu a notícia de que o CSMP decidiu instaurar-lhe um processo de
averiguações, pela entrevista que deu ao JN no dia 4, criticando as demissões na
PJ/Porto?
Suponho tratar-se de exuberância jornalística. O Conselho Superior nada me
comunicou. Com o dr. Cunha Rodrigues, enquanto procurador-geral da República, o MP
conseguiu um estatuto de alta relevância na defesa da legalidade democrática, aí
incluídos direitos tão fundamentais como a liberdade de expressão, de opinião e de
crítica. Essa tradição, que faz já parte do legado MP, tem vindo a ser seguida pelo actual
procurador-geral da República. Como seria pensável que o MP fosse, nos termos
constitucionias, o defensor da legalidade democrática quando se trata dos outros e não
praticasse a mesma doutrina "intra muros", com os seus magistrados?
Não gosta de ver os magistrados nos órgãos do futebol. Acha que deviam ser proibidos?
Não é uma questão de "gostar". É, quanto a dirigentes de futebol, uma questão ética,
como a mulher de César. Os magistrados têm direito de se associarem igualmente no
futebol. Acho que lhes fica mal, prejudica a função, mas nada os proibe e não sou a
favor de proibições. Cada um decide por si, com as necessárias consequências. Quanto
aos órgãos da Liga e Federação, não me restam dúvidas da proibição constitucional e
legal da sua estadia em tais organismos. Não é preciso proibir, estão proibidos, já que
recebem segundo aqueles organismos compensações monetárias.
Casa Pia foi o tema que dominou a agenda do último ano. O número dois do PS não foi
pronunciado. Isso não afecta a credibilidade do sistema judicial?
Todos os dias arguidos acusados pelo MP não são pronunciados. O MP conforma-se, o
processo é arquivado, não se conforma, recorre para a Relação. É assim no Estado de
Direito. O Ministério Público não é um acusador implacável, mas órgão de Justiça.
O que pensa do actual PGR?
Estou muito marcado por Cunha Rodrigues que foi procurador-geral da República
durante 15/16 anos. Tratava os grandes temas da Justiça: a organização judiciária, a
independência dos tribunais, a autonomia do MP, as relações entre Justiça e
Comunicação Social. Nunca o vi versar minudências ou mediocridades. Era visto como a
"face" da Justiça. Amado por muitos e odiado por outros tantos. São assim os grandes
homens. Não me acho com competência, nem devo, pronunciar-me sobre o desempenho do procurador-geral da República, em exercício. A história falará por mim.   

Sem comentários: